Em todos os condomínios, não havendo regra em contrário, há sempre quem tenha animais de estimação. É um facto que nem todas as espécies se adaptam a um apartamento, por isso a maioria das pessoas opta por animais de pequeno porte como os peixes de aquário, os cágados, os piriquitos e os bichos da seda. Os mais temerários e carentes, avançam para bichos peludos como o gato e têm normalmente o cuidado de o esterilizar, a fim de evitar enlouquecer, nos meses cruciais, com os seus miados cavernosos. Mas há quem não goste de gatos e prefira o cão - é aí que começam os problemas.
Alguns vizinhos meus têm cães. Os mais cuidadosos optaram por raças minúsculas que, embora com um aspecto ridículo (tremem por todos os lados ou andam de laçinho no toutiço), têm a vantagem de ocupar pouco espaço no elevador, de fazer mijas mais pequenas nos patamares e do seu ladrar enervante ser menos audível que o das raças de grande porte. Isto é aceitável. Mas o que dizer daqueles que, por razões que escapam ao entendimento, optaram por um Rottweiler ou um Labrador?!
Aqui há uns anos um dos meus vizinhos era dono de um Rottweiler. Invariavelmente cruzavamo-nos no elevador e o animal, com os seus 60 quilos (como afirmava o dono orgulhosamente) era bem maior que qualquer uma das minhas filhas. O bicho era manso, mas sempre que nos via pulava de alegria e distribuia lambidelas intercaladas com sonoros latidos. Eram viagens dantescas - o elevador abanava; os latidos eram ensurdecedores; saímos a tresandar a cão por todos os lados. Nunca me queixei, porque até gostava dele e o dono era um descanso para os olhos. O animal acabou por morrer de enfarte e o dono consolou-se com uma mota que não cabe no elevador.
Esta história toda para contar uma outra, relacionada com a cadela da minha vizinha do lado (cadela mesmo...não é a vizinha, coitada!). Trata-se de um espécime estranhíssimo, grotesco, digno da imaginação de um Tolkien. Chamamos-lhe o cão-vaca, porque de facto tem vagas semelhanças com esse mamífero ruminante - o corpo grande e enchouriçado de tão gordo, está revestido de um pelo branco sujo com malhas castanhas. A cabeça, pequena em relação ao corpo, tem dois olhos encarniçados e esbugalhados, que o animal revira, sempre desconfiado e rancoroso. Ora o cão-vaca ladra, ladra e ladra. Sempre que alguém acede ao patamar ele dá logo o sinal - atira-se, enlouquecido, contra a porta da sua casa e é um problema para se acalmar.
Há coisa de umas duas semanas, ao final do dia, o improvável aconteceu...é que eu tenho um gato!
Tudo aconteceu muito rapidamente. Eu tinha a porta de casa aberta e a minha vizinha também. O meu gato, resolveu ir cheirar o patamar e ...zassss...entra em casa a grande velocidade, perseguido pelo cão-vaca. A fuga terminou debaixo da minha cama, com o cão-vaca encarniçado a tentar alcançar o gato. Foi a vizinha quem deitou a mão à alimária, lhe meteu a trela e a arrastou para fora da minha casa com grande estardalhaço. Pacificados os ânimos, a dita senhora pediu-me desculpa, mas acrescentou: "Olhe que tem de ter cuidado. Não pode deixar o seu gato andar assim, à solta, na escada." Está visto quem manda no patamar! Calei-me, porque até nos damos bem, eu e a vizinha. Mas, qual o meu espanto, quando no dia seguinte, rente à hora do jantar, me bate o administrador do prédio à porta: " Desculpe vizinha, mas a senhora que mora no andar abaixo do seu apresentou-me uma queixa de violência doméstica. Está tudo bem consigo e com o seu marido? É que parece que foi uma discussão muito feia ontem ao fim do dia..."
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